15 de janeiro de 2007

Felicidade em drágeas

É inevitável associarmos o incentivo ao consumo da "pílula da felicidade" Prozac produzida pelo laboratório Eli Lilly com a domesticação maciça realizada pelas instituições no poder. A ilusão de felicidade medíocre criada e mantida pelas mídias de comunicação de massa, a fim de manter o mercado financeiro mundial aquecido é um projeto de adestramento e domesticação dos seres "pensantes" de Gaia que já dura mais de 2000 anos. Valores e estilos de vida são criados e estabelecidos como única condição de realidade. Sonhos e necessidades são gerados através dos veículos de comunicação. Os padrões ocidentais de beleza, a estabilidade financeira adquirida por um emprego medíocre, o sonho da casa própria, do casamento eterno, de um Deus transcendente com o poder de decisão sobre as vidas em Gaia, são mórbidas estratégias de domesticação, aplicadas e incentivadas para que a lucidez da realidade medíocre que permeia esses universos seja mantida em estado de coma. Sem dúvida, habitar uma realidade mórbida, atravessada por valores moralistas e materialistas, direcionadas à um futuro longínquo, homogênea em sua essência, padronizada, esquadrinhada, é habitar o cenário da depressão e do desespero. Os padrões estabelecidos são os responsáveis pelas constantes insatisfações emocionais que permeiam os seres pensantes de Gaia, já que, uma vez estipulada à referência, segue-se impulsivamente em busca de sua conquista. A minuciosidade das ações táticas do projeto global de adestramento é desvendada a partir de óbvias e simples associações. Uma vez criada uma realidade sustentada por valores mórbidos e antivitais, é criada também a pílula da adaptação. Lançada comercialmente nos Estados Unidos em 1987 e rapidamente apelidada de "pílula da felicidade", o Prozac é desde então, uma das estratégias mais poderosa utilizada pelo projeto global de adestramento dos seres pensantes de Gaia, uma vez que se tornou um gigantesco fenômeno comercial consumido por mais de 35 milhões de seres pensantes. A humanidade está refém do cloridrato de fluoxetina, substancia química que atua no cérebro modulando o estado de humor e a sensação de bem-estar a partir do aumento da oferta do neurotransmissor serotonina, uma das substâncias químicas que fazem a comunicação entre os neurônios. Diante de realidades mórbidas, a humanidade entra em desespero e para adaptá-la é incentivado o consumo da pílula da felicidade. Os seres pensantes consumidores da pílula da felicidade, são criaturas sem brilho no olhar, contentam-se alegremente com a realidade que antes os atormentavam e adaptados, seguem suas vidas medíocres de consumidores alienados e felizes. Sorrisos amarelos, andar agitado, emoções dopadas, apelo ao medo, sexualidade atormentada, consumos excessivos, é o preço que se paga para obter a harmonia com a pílula da felicidade. Há urgência de uma transformação desta realidade. O campo de adestramento começa a atingir as crianças. O governo dos Estados Unidos autorizou médicos a receitarem o uso do Prozac para crianças e adolescentes de 7 a 17 anos, mesmo sabendo que seus efeitos sobre o desenvolvimento de crianças ainda não são totalmente conhecidos. Segundo o psicanalista Contardo Calligaris, autor de "Hello Brasil" "O funcionamento psíquico pode ser descrito em termos de química cerebral, seu equilíbrio pode ser alterado quimicamente. Mas é também evidente que a química cerebral é ligada a nossa exposição a um ambiente infinitamente complexo de relações (atuais e memorizadas) com o mundo e, sobretudo com os outros com quem cruzamos ou vivemos. Para agir rapidamente e sem se questionar muito, é possível esquecer esta complexidade toda e optar por um Prozac bem feito, esperando que venha a reduzir química e diretamente as alterações produzidas pelos avatares de nossas vidas”. O limbo está pronto e habitado por criaturas mórbidas e sorridentes, o atalho para o caos chama-se lucidez e a estratégia chama-se coragem. Transformações são necessárias e superar realidades infelizes é a condição suprema de todo habitante de Gaia, afinal a vida é caótica, mutante, e tem nas transformações, a sua expressão. Vidas que não se expressam, adaptações a realidades mórbidas, refletem o sucesso dos objetivos cruéis do projeto global de adestramento realizado em Gaia. Desafiar a própria vida é a condição de criarmos realidades e libertar-nos do mal do milênio: a alienação. (03.2004)

*Carolina Borges, educadora multimídia, DJ, estudante da filosofia, de Nietzsche e Deleuze. Pesquisadora de cultura digital, colaborou com o Projeto Metáfora. Atuou no CIDEC ( Centro de Inclusão Digital e Educação Comunitária ) na Escola do Futuro (USP), para o projeto Acessa SP do governo do Estado de São Paulo, coordenou o Projeto Cinemação - exibição de curtas metragens na periferia de São Paulo. Graduada em economia pela universidade Mackenzie Escreveu roteiros para documentários, performances e curtas metragens. Editou o blog Ciberutopias http://www.ciberutopias.blogger.com.br .

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