10 de junho de 2007

Sobre a Venevisión e Chávez

Eduardo Guimarães traz uma luz sobre o tema. Buscará informações que contradigam o senso comum de que a Venevisión virou "chavista". Na sua hipótese, Cisneros deixou de ser golpista ao perceber que o plano de 2002 não deu certo. Só isso. Continua a fazer oposição e o Eduardo pretende provar, a partir de material gravado na própria Venezuela.
Só há um modo eficaz de defender pontos de vista: corajosamente. Quando os que têm idéias próprias - ou encampadas com base em reflexões e em fatos e não em preconceitos - abraçam uma causa, devem se dispor a não fazer de conta que não ouvem as contra-argumentações consistentes. É preciso coragem para encarar de frente argumentos fortes que se opõem aos nossos, seja para encontrar-lhes o ponto fraco ou para reconhecer que aquilo em que acreditamos não é bem aquilo que pensávamos.
Até agora, o único argumento forte contra a não-renovação da concessão da RCTV pelo governo da Venezuela foi dito pelo coordenador do Observatório da Imprensa, Alberto Dines, e por mais alguns poucos que deixaram de lado a superficialidade nesse tema. À diferença de dúzias de formadores de opinião da grande mídia que fogem de reconhecer que a RCTV não era apenas "a maior e mais popular emissora venezuelana" e, sim, um grupo empresarial que cometeu crimes previstos em praticamente todos os arcabouços legais do mundo inteiro, Dines reconheceu as ações criminosas da emissora de Marcel Granier. Vejam:
"É verdade que a RCTV embarcou no golpe que tentou derrubar Hugo Chávez em 2002, mas também é verdade que a Venevisión, de Gustavo Cisneros, foi igualmente golpista e hoje desfruta de todos os privilégios do governo de Chávez. Significa que há golpistas que interessam a Hugo Chávez e golpistas que precisam ser calados."
Dines é esperto. Tocando num ponto das justificativas de Chávez que de fato as contradizem, ele dá informações imprecisas, não confirmadas e, provavelmente, inverídicas, e ninguém diz nada porque, até agora, ninguém conseguiu uma explicação para a contradição aparentemente verdadeira que o observador "da imprensa" apontou no discurso de Chávez. Afinal de contas, por que é que a Venevisión, que talvez tenha tido uma participação mais ativa no golpe de 2002, não teve sua concessão cassada? E mais: é certo Chávez punir um golpista e não punir o outro?
Para responder essas questões precisamos, primeiro, analisar o direito constitucinal do governo venezuelano - ou de governos de vários outros países sob regimes democráticos, como o Brasil - de renovar ou não uma concessão pública. A Constituição venezuelana, tanto quanto a brasileira, concede à subjetividade do governante de turno o direito de decidir sobre a renovação de uma concessão de faixa no espectro radioelétrico. Nem seria preciso que a RCTV tivesse enveredado pelo caminho da criminalidade para ter sua concessão cassada.
A diferença entre a RCTV e a Venevisión, portanto, é a seguinte: ambas cometeram crimes que incluem incitação à violência, o que mostra bem o documentário dos repórteres irlandeses Kim Bartley e Donnacha O’Brien "The revolution will not be televised" (A revolução não será televisionada), que mostrou que em 2002 as TVs incitaram a parte da sociedade venezuelana contrária a Chávez a ir às ruas confrontar os chavistas sabendo que fazê-lo provocaria um banho de sangue, que acabou ocorrendo. Além disso, as duas emissoras integraram o complô que seqüestrou o presidente constitucional da Venezuela e desmantelou todas as instituições de Estado. Contudo, a emissora de Gustavo Cisneros abdicou do golpismo depois que Chávez retomou o poder.
Tanto falam do "autoritarismo" de Chávez, mas omitem que ele, no sentido de pacificar a sociedade venezuelana, depois de derrotado o golpe abriu mão do direito (ou dever?) de prender os golpistas e de cassar imediatamente a concessão das emissoras responsáveis por uma terrível mortandade. Ninguém pode negar que as TVs privadas venezuelanas, nos momentos que precederam o golpe, no momento em que ocorriam confrontos a tiros nas ruas de Caracas veicularam reiteradas chamadas convocando a população a sair às ruas, quando deveriam pedir às pessoas que não se expusessem à violência e que não cometessem atos violentos. Em qualquer país civilizado, os donos dessas emissoras deveriam ser presos. E ninguém pode negar a incitação à violências das TVs privadas porque há horas de gravações dessas incitações.
Chávez optou por não adotar o caminho mais radical, mesmo sendo o mais correto, e esperou que as TVs golpistas retrocedessem do golpismo. Venevisión e Televén agiram nesse sentido; a RCTV e a Globovisión, não. Assim, grupos privados, que já haviam provado que podem usar uma concessão do Estado para cometer crimes, continuaram na linha do golpismo, apresentando programas que continuaram incitando a violência, a intolerância e o confronto e calando as divergências.
Ninguém duvida de que não são puramente idealistas e éticas as razões de Gustavo Cisneros (dono da Venevisión) para abdicar do golpismo e de fazer um jornalismo equilibrado - sim, equilibrado, pois é mentira que a Venevisión não faz críticas ao governo Chávez e pretendo provar isso quando viajar para a Venezuela em outubro deste ano gravando em vídeo programas da emissora que desmentem tal afirmação. Mas, no fim das contas, as razões de Cisneros não interessam, o que interessa é que sua emissora parou de atentar contra a sociedade venezuelana.
Voltando a Alberto Dines, ele diz que "a Venevisión, de Gustavo Cisneros, foi igualmente golpista e hoje desfruta de todos os privilégios do governo de Chávez". Afinal, que "privilégios" são esses? Essa frase, colocada dessa forma, induz as pessoas à crença em fatos que não se sabe quais são. Afirmar isso assim, sem explicações, não é correto, para dizer o mínimo.
Esta questão não termina aqui. Pretendo desmontar essa falácia de que a Venevisión e a Televén passaram a produzir um jornalismo oficialista e que estão sendo subornadas pelo governo Chávez para fazê-lo. Pretendo conseguir provas de que as duas emissoras simplesmente passaram a fazer um jornalismo equilibrado, que para os padrões golpistas da mídia venezuelana alguns consideram "insuficiente", mas que é, apenas, um jornalismo correto, em que há pluralismo em lugar de manipulação. E farei isso quando for à Venezuela, de onde trarei provas cabais que desmontarão, uma por uma, todas as mentiras que têm sido ditas aos brasileiros por seus meios de comunicação.

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