12 de julho de 2007

Mercadante chuta bola nas costas e recebe bolada na cara

Valter Pomar responde ao artigo ‘Uma crítica injusta’ do Senador Aloízio Mercadante:
O Senado e a democracia
Um reconhecimento inicial: deve ser muito difícil ser petista e senador da República. A correlação de forças existente naquela “Casa” (bem como os hábitos senatoriais) exige, dos senadores petistas, muitas flexões táticas e verbais. Sem isso, provavelmente não seria possível aprovar posições de interesse do governo e do Partido.
É nestes marcos que interpreto o artigo intitulado “Uma crítica injusta”, do senador Aloizio Mercadante (PT-SP), publicado no jornal O Globo e na página eletrônica do PT, no dia 5 de julho. Noutras palavras: trata-se de garantir o fundamental (aprovar a entrada da Venezuela no Mercosul). Ademais, as declarações recentes do presidente da Venezuela colocaram os parlamentares petistas na defensiva. O pedido aprovado por senadores, dirigido ao governo da Venezuela, pedindo que fosse revista a decisão sobre a RCTV, só ganhou repercussão devido a resposta desproporcional do presidente Hugo Chávez. E a cobrança, feita aos congressos do Paraguai e do Brasil, de uma aprovação rápida da adesão da Venezuela ao Mercosul, sob pena da Venezuela desistir de entrar, foi um tiro no pé, ajudando os inimigos da integração.
Isto posto, acho que o Senador Mercadante, no justo propósito de convencer seus pares e a sociedade de que continua sendo fundamental aprovar a entrada da Venezuela no Mercosul, lançou mão de alguns argumentos totalmente incorretos.
Em primeiro lugar, é um erro defender a entrada da Venezuela no Mercosul com o argumento de que o “jovem Mercosul” pode desempenhar um papel “civilizador” para com a Venezuela. Desde a colonização, os que prometem civilização e democracia, costumam entregar barbárie e ditadura. Ademais, é inaceitável comparar (mesmo que indiretamente) o governo Chávez com as ditaduras de Franco e Salazar.
O que a direita mais deseja é, exatamente, convencer as pessoas do caráter “ditatorial” e “totalitário” do “populista” Chávez. Não vejo por qual motivo devemos alimentar, ainda que com mediações, esta linha de argumentação.
Mercadante erra, também, quando coloca no mesmo plano o golpe de 2002 e a não-renovação da concessão da RCTV.
Quando Chávez foi vítima de golpe militar, em 2002, o então deputado Mercadante conseguiu “aprovar, na Câmara, moção que repudiava quaisquer tentativas de interromper o processo democrático na Venezuela. Não se tratava de manifestar solidariedade a um governante, mas de apoiar a democracia na Venezuela (...). Agora, quando o Senado apela para que seja revista a decisão de fechar o canal RCTV, que apoiou o golpe de 2002, não o faz para manifestar repúdio ao governo venezuelano, mas essencialmente para dar suporte à democracia na Venezuela”.
Segundo Mercadante, num e noutro caso, o Congresso Nacional brasileiro age com a intenção de “proteger a democracia e os interesses” da Venezuela.
Podemos concordar ou discordar da não-renovação da concessão, mas dizer que a retomada de um bem público (a concessão) constitui ameaça a democracia, comparável a um golpe de Estado, é aceitar o argumento da direita, segundo o qual a existência da mídia privada (monopolista, por sinal) seria um indicador de excelência democrática.
Um comentário final sobre o texto do senador Mercadante. O fato de fazermos parte de certas instituições não deve nos levar a assumir um patriotismo institucional. Isto vale, por exemplo, para os senadores eleitos por nós do PT.
O Senado brasileiro é uma instituição profundamente antidemocrática. Ao contrário da Câmara, que representa o povo, o Senado deveria representar a federação. Mas a Constituinte deu ao Senado o papel de Câmara revisora. Com oito anos de mandato, com suplentes que não são eleitos pelo povo, com o poder de revisar as decisões dos deputados, o Senado precisa mudar muito, antes de poder ensinar democracia a quem quer que seja.
Valter Pomar, secretário de relações internacionais do PT

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