O documento foi divulgado pelo advogado Leandro Scalabrin durante audiência pública na Assembléia Legislativa sobre a violência policial contra os movimentos sociais. Em sua apresentação, Leandro afirmou que se trata de uma conspiração que teve início no ano de 2006, com um dossiê formulado pelo comandante do Comando Regional de Policiamento Ostensivo (CRPO) do Planalto, Waldir João Reis Cerutti. Antes de se licenciar para concorrer a deputado estadual pelo Partido Progressista (PP), o coronel escreveu um documento em que investiga, além do MST e da Via Campesina, suas relações com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e a Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB).
No relatório, como descreveu Leandro, o coronel afirma que o MST tem relação com o PCC, de São Paulo, e com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC). “O relatório informa que há o objetivo de criar uma zona de domínio, de controle através do domínio territorial, onde o MST substituiria o Estado, tal como ocorre com o tráfico nas favelas do Rio. A zona territorial branca compreenderia a área abrangida pela Fazenda Annoni e a Fazenda Guerra, em face de sua localização estratégica, acesso a todo o Estado e à Argentina, e por ser uma das zonas mais ricas e produtivas do Estado”, relata.
O relatório do coronel Cerutti serviu de embasamento para que promotores e juízes da região encaminhassem pedidos de busca e apreensão em acampamentos até ordens de prisão e de reintegração de posse. A articulação contra o MST também contou com a participação de ruralistas. As informações do coronel Cerutti foram utilizadas pelo proprietário da Fazenda Guerra para entrar com ação no Ministério Público contra o MST.
Uma segunda etapa de investigação do MST ocorreu com o coronel Paulo Mendes, na época subcomandante da Brigada Militar. Os policiais chegaram a investigar, sem autorização, funcionários do Incra, deputados estaduais, prefeitos e cidadãos que segundo a Brigada apóiam de alguma forma o MST. O Estado Maior da corporação ainda conclui que a atuação dos sem terra é taticamente organizada como se fosse operação paramilitar e, como na investigação do coronel Cerutti, propôs à Justiça uma série de ações para reprimir os sem terra.
Ao mesmo tempo, o Ministério Público pediu uma investigação à Polícia Federal, que concluiu que o MST não é uma organização paramilitar e não representa perigo à segurança nacional, como afirma a Brigada Militar. Apesar de constar no dossiê, as conclusões da Polícia Federal não são levadas em consideração pelos promotores. “Aqui no RS, nos últimos dois anos, a execução dessa estratégia ocorre inicialmente através do Batalhão de Operações Especiais [BOE], e agora diretamente com o comandante da corporação [comandante da Brigada Militar Paulo Mendes]. Ocorre um intercâmbio intensivo entre o Ministério Público Estadual, Brigada, Ministério Público Federal, Polícia Federal e Poder Judiciário, que cooperam e seguem tarefas da corporação. O BOE se transforma em uma autoridade superior com atuação autônoma, na qual a separação entre Polícia Civil e Militar, como revelam a elaboração desses dossiês que apresentam a investigação inclusive de deputados sem autorização da Assembléia Legislativa, da forma como o DOPS fazia durante a Ditadura Militar, violam a nossa Constituição”, analisa Leandro.
Deputados e senadores presentes na audiência ficaram estarrecidos com o documento. Para a deputada Stela Farias (PT), que acompanha os casos de repressão no Estado, o documento deixa claro que a violência usada pela Brigada Militar com mais ênfase desde 2007 já integra a articulação para acabar com os movimentos sociais.
“Nesse sentido, o que a gente vê? A gente observa o recrudescimento, hoje para nós ficou patente. Por exemplo, eu não tinha conhecimento desse absurdo que é a manifestação do Conselho Superior do Ministério Público, quer dizer esse conjunto de ações que violam os direitos das pessoas humanas, dos movimentos sociais. Agora eu consigo compreender melhor. Isso aqui é a comprovação do que ocorre no Estado do RS”, diz.
Deputados estudam a possibilidade de entrar com recursos judiciais contra a atuação do Ministério Público e da Brigada Militar. O senador José Nery (PSOL-PA), que integrou a diligência do Senado, propôs que as ações fossem levadas ao Conselho Nacional de Justiça.
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