Às vesperas da eleição presidencial de 2006, o Ministro Marco Aurélio de Mello veio à público com uma “denúncia” de que seus telefones e os de outros dois ministros do TSE estariam sendo grampeados. Ele chegou a insinuar que o governo Lula era responsável pelo grampo. Era mentira. Em 2007, Gilmar Mendes e Marco Aurélio de Mello vieram à tona com a história de que estavam sendo grampeados. Até a Globo noticiou: era mentira. Em 2008, quando a Operação Satiagraha do Doutor Protógenes conseguiu colocar na cadeia o banqueiro Daniel Dantas, Gilmar Mendes fez hora extra no fim de semana para soltá-lo duas vezes. Alguns dias depois, Mendes disse que havia ouvido da desembargadora Suzana Camargo a acusação de que o juiz Fausto de Sanctis o havia grampeado. Curiosamente, a desembargadora fez essa gravíssima acusação e depois pediu que a “esquecessem”. O grampo? Era mentira.
E eis que a Revista Veja agora publica uma “reportagem” que “demonstra” que a ABIN teria grampeado ... quem? Gilmar Mendes, claro! O mesmo que vem tentando há um ano convencer-nos de que é vítima de um totalitário estado que grampeia seus telefones. Quem afirma que houve grampo? Uma revista especializada em públicar mentiras sobre dólares em caixas de uísque ou guerrilhas colombianas financiando o partido do presidente. Qual a fonte? Um “anônimo” da ABIN, que teria passado à revista a notícia do grampo ilegal realizado pela própria agência de inteligência em que trabalha! Qual o conteúdo do grampo? Uma conversa do palhaço Mendes com um senador da oposição, na qual o presidente do STF aparece como destemido aliado da luta contra a pedofilia. Qual a evidência apresentada? A transcrição da conversa, cuja veracidade é avalizada pelo ..... próprio Gilmar Mendes! Alguma outra evidência? Nada, além da palavra do próprio palhaço que encontra no factóide a justificativa para a ladainha que ele vem há um ano inventando – e sendo desmentido pelos fatos. É o único grampo da história da humanidade feito para que o grampeado fique bem na fita! Não é coisa de gênio? Se algum escritor iniciante me apresentasse isso como enredo de uma farsa em três atos, eu diria: volte para o computador, meu filho, comece tudo de novo e escreva algo mais verossímil.
A imprensa controlada por oligopólios é ruim no mundo todo, mas em pouquíssimos países organizações com uma história de criminalidade comparável às da Revista Veja e da TV Globo operam com tal grau de desfaçatez. A triste novidade deste quadro é que um jornal que costumava ter um pouco de decência -- a Folha de São Paulo – está no mesmíssimo barco. Revisem as manchetes do Caderno Brasil da Folha do dia 18 de agosto ao dia 29. O que elas têm em comum? O palhaço Mendes está presente em todas as edições desse período, sempre pontificando sobre algum vago “estado policial” que ele, paladino da justiça, enfrenta com bravura. Nem uma palavra contraditória. Nem uma palavra sobre a reputação deste senhor. Nem uma palavra sobre como ele é detestado pela sociedade brasileira. Nada. Só o jornal servindo como seu megafone. Aliás, o portal UOL deve um pedido de desculpas aos seus leitores. Ao longo do sábado, o UOL publicou a manchete ABIN espionou Gilmar Mendes. Assim, como se fosse fato comprovado. Só na virada do sábado para o domingo o UOL acrescentou o importantíssimo diz a Revista Veja.
Em retórica, costumamos diferenciar o modo constativo do discurso do modo performativo. Frases como 1) está chovendo agora em New Orleans, 2) Lula foi eleito com 62% dos votos 3) o Flamengo é sistematicamente beneficiado pelas falcatruas da CBF descrevem fatos da realidade. São frases que estão no modo constativo. Mas a linguagem não serve só para comunicar ou descrever. Ela também é usada para moldar, produzir a realidade. O exemplo clássico é o padre ou o juiz que enuncia eu vos declaro marido e mulher. A frase não descreve um estado de coisas anterior à sua enunciação. Os personagens da frase viram marido e mulher pela própria intervenção do ato lingüístico. É a linguagem no modo performativo.
Uma das operações mais desonestas que se pode fazer com a linguagem é lançar enunciados pretensamente constativos com um objetivo que é, na verdade, performativo. É uma das desonestidades mais típicas de Gilmar Mendes. Quando ele diz que “o país passa por um quadro grave de crise institucional”, ele finge não saber que o Brasil não passa por crise institucional nenhuma. Nesse fingimento, ele quer é produzir a crise que supostamente descreve. Desonestamente, usa o constativo para mascarar uma operação performativa. Tudo isso para, num segundo momento, ter a cara-de-pau de dizer que o presidente Lula tem que ser "chamado às falas", para responsabilizar-se pela crise que ele mesmo, Mendes, produziu, com a ajuda inestimável do panfletinho criminoso da Editora Abril.
É possível que a ABIN tenha grampeado Mendes? Sim. É possível que uma pessoa alfabetizada ainda acredite, por um motivo que não seja a pilantragem, numa denúncia veiculada pela Revista Veja? Sim. Tudo é possível. Eu me encontro, neste momento, numa cidade de 700.000 habitantes que acreditam piamente que Elvis Presley não morreu no dia 16 de agosto de 1977. Mas, por enquanto, a tarefa mais urgente é continuar o processo de desmoralização da Veja e de denúncia desse arremedo de jurista, excrescência farsesca e vergonha nacional que é Gilmar Mendes.
Fonte: O Biscoito fino e a massa
Um comentário:
E o governo Lula embarca sempre nestas ondas. Lula surfando na maionese da burguesia BR-ega.
Abraço
Runildo Pinto
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