O filme Mississipi em Chamas (1988) é a história da morte de três jovens pela Ku Klux Klan. Simples. A trama, quero dizer. O que a torna complexa, profunda, arrebatadora é o fato do vazio que nos dá quando todo mundo sabe do ocorrido, todo mundo tem o rabo na história, e muitos a justifiquem, e a coisa não desenrola. Numa pequena cidade do Mississipi, as relações de poder, de racismo, estão profundamente arraigadas. Todos os envolvidos sabiam que o que acontecera, acontecera, era verdade. Mas a força que os unia era maior do que o crime e por isso a verdade tendia a não aparecer.
Até que o personagem vivido por Gene Hackman, através de meios heterodoxos consegue quebrar a lei do silêncio e o castelo de cartas começa a desabar.
Vendo o filme mais uma vez, reprisado neste fim-de-semana, não pude deixar de vê-lo como analogia, reflexo ficcional de nossos subterrâneos modernos.
É claro que a CPI que hoje domina o cenário político gaúcho, o seu mote principal, enfim, é do conhecimento de todos. E todos sabem a verdade. A governadora sabe, o deputado Coffy Rodrigues sabe, Lasier Martins sabe, Políbio Braga sabem. Rogério Mendelski também sabe. A rbs (em minúsculas, claro) sabe. Pedro Simon, Eliseu Padilha, oh, como sabem. Sérgio Guerra e José Serra sabem. Rosane de Oliveira, sugou esta verdade em alguma flor, e sabe. O Santana, preso em seu labirinto, sabe. Até o Lula, que não sabe de nada, sabe. Os promotores sabem. A juíza de Santa Maria, pasmem!, sabe! Chico Fraga, Lair Ferst, José Otavio Germano, Záchia, Dorneu Maciel, as cervejas de Ricardo Lied, os milhões gastos em publicidade pelo Banrisul em nome da verdade, sabem. Até o Vaz Neto e o Chico Fraga, da prefeitura de Canoas, sabem. Tchê, o como sabem! Valna Vilarins, que emprestou cem mil para Yeda, sabe. Olha, até o Lauro e o Wianey sabem. Imaginem: se eles sabem, o grau de dificuldade!? Todo mundo sabe a verdade. O que falta?
O que falta é o que Hollywood ensina: falta Gene Hackman! Uma ação heterodoxa, alguém que esteja à beira de perder o escroto, por exemplo. Falta alguém como a esposa do policial corrupto e assassino, cansada de uma vida estúpida, sem sentido e assentada na violência racial. Quase tivemos este personagem. Mas ele foi suicidado pelo lago Paranoá. A Klan bicuda nervosa sobrevoa o enredo, o enterro, São Gabriel, os sem-terra sentados sobre formigueiros... o estado inteiro.
A esperança do Rio Grande do Sul é que Stela Farias se encontre com Gene Hackman. Ele talvez dissesse a ela: Será do meu jeito, ou não será! Só então talvez se desenterre de um imenso poço de lama, o cadáver da verdade.
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