Por Adão Paiani
Dei-me ao trabalho de assistir alguns trechos da longa sessão da Comissão Parlamentar de Inquérito que investiga as denúncias de corrupção contra o Governo de Yeda Rorato Crusius, ocorrida na segunda-feira (19/10), e transmitida pela TV Assembléia. Sim, porque não sei se todos sabem, essa CPI foi criada para investigar a corrupção iniciada antes, mas mantida, aprimorada e defendida nesse governo, por uma quadrilha organizada para assaltar os cofres públicos, ao contrário do que parece acreditar a base de sustentação da nossa angelical Governadora na Assembléia Legislativa do Estado.
Só o que pude ver, foi o suficiente para considerar aquilo uma das coisas mais vergonhosas a que tive o desprazer de presenciar na minha vida. E olha que já vi coisa feia por aí. Se aquele festival de barbaridades fosse minimamente mostrado pela TV aberta, tenho a certeza de que causaria uma verdadeira comoção popular. É óbvio que justamente por isso tais coisas não são mostradas. Afinal, quase 200 milhões de verbas publicitárias distribuídas pelos diversos órgãos da administração pública estadual, apenas em 2008, beneficiando desde a grande mídia até aos pequenos jornalistas movidos a jabá, têm lá o seu poder de convencimento e de construção de pautas.
Aliás, na sexta-feira passada, foram trazidas a público as novas despesas feitas pela Governadora a bem da governabilidade do Estado; conjuntos de cama, mesa e banho, escolhidos com o apuro e bom gosto próprios de quem não paga a conta, e que superaram mais de trinta mil reais em 2008; e que hoje encontram-se em lugar incerto e não sabido, segundo declarou a nobre defesa de YRC. No sábado, matéria de importante revista de circulação nacional trouxe, mais uma vez, novidades sobre os processos que tramitam no STF, e que envolvem cada vez mais os amigos do peito da ilustre mandatária maior do Estado. Leva um pufe verde-kiwi e um jogo de toalhas frapé quem aparecer com uma capa de qualquer jornal da mídia guasca que tenha feito alguma referência a isso.
Mas voltando à sessão a que me referia; nós, gaúchos, até bem pouco tempo, com a humildade que nos caracteriza, nos referíamos a certas práticas políticas e posturas parlamentares como típicas dos sertões do Brasil; mais especificamente, da política nordestina. Tudo aquilo era muito distante da nossa tradição, do nosso elevado grau de politização, (etc., etc., etc.). Perdão, irmãos nordestinos, a gente não sabia o que dizia.
Ou uma parcela significativa dos nossos deputados aprendeu muito bem e agora executa com primor o que viu por outras plagas, ou a imagem que tínhamos de nós mesmos fazia parte de uma megalomania coletiva. Prefiro ficar com a primeira opção, que dói menos.
Os que tiveram a oportunidade, a paciência e o estômago de assistir ao filme por inteiro puderam presenciar um festival de vilanias, de torpezas, de safadezas e desfaçatez de corar frade de pedra; e de sair aos gritos chamando o bandido. Espero que pais zelosos tenham pelo menos tido o bom senso de tirar as crianças de perto. Chamar o “fala liderança”; bem capaz! Aquele Federal das empreiteiras, nem pensar. O ex-coordenador-arrecadador de campanha; sem chance. Presidente e vice do banco estatal gaudério; jamais, vai prejudicar a imagem da instituição. Suicídio numa hora dessas chega a ser uma obrigação.
A única coisa que ainda salva o que nos resta de vergonha na cara, é uma minoria valente, que quer realmente investigar e punir a quadrilha que tomou de assalto a máquina pública do Estado, e que continua a espoliá-lo, e ao seu povo, com a cumplicidade de uma base que não tem condições morais de ter assento em um parlamento com quase 175 anos de história. Mas essa mesma minoria está, ao menos por ora, submetida ao deboche e à absoluta falta de noção de uma pretensa maioria; que não se mostra digna sequer dos votos que recebeu em suas bases eleitorais, e menos ainda do Rio Grande; ao menos aquele do nosso imaginário coletivo.
Questões de ordem, inversões de pauta, procrastinações, tudo no limite da prevaricação; mas usados para tentar jogar para debaixo do tapete o assalto aos cofres públicos e, mais do que isso, a dignidade de todo um povo. Que triste momento para uma casa que já abrigou Bento Gonçalves, Silveira Martins, Getúlio Vargas, Leonel Brizola, Carlos Santos, Alberto Hoffmann. Sem me render a um saudosismo idealista, mas esses eram homens que souberam honrar o mandato que receberam, e por mais críticas que possa se fazer a eles, não podemos negar que eram, decididamente, de outra estirpe. Pelo menos atendiam por seus nomes próprios, e não por apelidos; que a essa altura do campeonato mais parecem alcunhas vulgares.
Mas por serem vinagre barato, e não vinho de boa cepa, nada interessa a alguns desses de hoje. O momento é o que importa. Os compromissos assumidos com a “liderança” de plantão. As trocas de favores, os cargos; uma verbinha aqui e acolá. E quando faltam os argumentos, o que dada à baixa qualificação intelectual de muitos, acontece com assustadora freqüência; o negócio é dizer que quer “investigar tudo”! Os corruptos de vocês são tão bons quanto os nossos! Não investiguem aqui que a gente puxa lá de trás! Como se a safadeza fosse melhor ou pior, ou exclusividade dessa ou daquela grei partidária ou cor ideológica. Esquecem que safado é safado, ladrão é ladrão; independente de onde se esconder. O que milhões de gaúchos a essa hora querem saber é onde foi parar nosso dinheiro; e que a corja responsável por isso seja punida. Simples assim.
Realmente; pra encerrar, só uma palavra me socorre nessa hora para qualificar os responsáveis pelo saque e aqueles que pela cumplicidade e/ou omissão, também o são pela impunidade; e digo sem medo:
Cambada!
Um comentário:
Contundente e justo desabafo. Assino embaixo.
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