SENTIMENTOS
Quem já passou pela infelicidade de perder alguém de sua família?
Muitos de nós. Estes, com toda certeza, sabem como é sofrido. Os demais imaginam. Digo, nem todos os demais. Somente as pessoas com uma mínima sensibilidade.
Pois bem, eu perdi meu pai e minha mãe em um acidente de trânsito no dia 2 de novembro de 2009, na Estrada do Mar.
Os sensíveis solidarizam-se e conseguem empaticamente sentir o que isto significa e as marcas que deixa.
Meu pai, motorista há muitos anos, sempre extremamente prudente e sem nada que desabonasse sua responsabilidade teve um mal súbito e isto foi o que provocou o acidente. Tudo o que passa e sente uma filha, os netos e demais familiares é indescritível.
Mesmo neste momento, no dia, na semana, nos meses seguintes precisamos enfrentar a situação e encaminhar várias documentações, solicitações, por conta de uma burocracia que dizem ser necessária para que tenhamos os direitos reconhecidos (liberação do veículo, seguro, auxílio funeral, etc).
No entanto, no dia 14 de fevereiro (vejam, 3 meses depois), ainda sem muitas das situações referidas no parágrafo anterior devidamente resolvidas, fui agredida com a visualização do veículo durante uma viagem pela referida estrada. Aqueles de sensibilidade mais aguçada devem imaginar a dificuldade que era, para mim, passar em tal estrada e o que senti ao ver o veículo. Não sei quem autorizou essa exposição. Porém, acredito que para a sua felicidade nunca deve ter passado por isso. O que deveria ser um final de semana para recarregar energias para um ano de trabalho transformou-se em um final de semana rememorando momentos terríveis.
Talvez até não estivesse tão empenhada em divulgar esse fato e solicitar mudanças neste tipo de postura se não tivesse isso agredido também a memória de uma pessoa que não pode defender-se. A imagem distorcida que milhares de pessoas que por ali passaram teriam daquele motorista causou-me revolta. Então percebi que moralmente eu tinha uma obrigação de defender não só aquele que sempre me deu bons exemplos em todos os sentidos, mas também possíveis futuras vítimas como nós.
É claro que existe um motivo para o carro estar ali: a campanha de prevenção de acidentes. Campanha esta com a qual concordo e a qual dignifico. Porém, meu pai não foi imprudente. Ele também foi vítima. Não de imprudência de ninguém. Não sei exatamente do quê. Destino? Não sei. Mas sei que não foi imprudência. Meu pai nunca foi imprudente no trânsito e de repente é exposta esta imagem errônea publicamente, sem mesmo a necessária – ou, parece neste caso, a desnecessária – burocracia da autorização da família.
Pois bem, não quero contestar a campanha. Sugiro apenas que utilizem veículos com a ciência da família e que tais veículos realmente tenham se envolvido em acidentes por imprudência. Ouso até propor que junto ao veículo seja colocado um painel com a causa do acidente: ingestão de álcool, excesso de velocidade, ultrapassagem em local proibido, etc.
Reitero, finalizando, que meu objetivo é apenas que outras pessoas não sintam o que senti e, principalmente, deixar claro que meu pai não teve culpa, não foi um acidente por imprudência.
Cristina Haubrich
O Estado do RS desrespeita elementares direitos de cidadania: a honra do motorista, a memória da família, além de apropriar-se de um bem que não é seu, sem sequer ter a decência de solicitar autorização para tal! A qual seria negada, por certo, já que não foi um acidente provocado pelos males que afligem as estradas, como álcool, por exemplo.
Acreditamos que é caso para reparação judicial. Conviver com a saudade é uma coisa; outra, é conviver com a ofensa e com a injustiça.
Imagem: Blog do Litoral
3 comentários:
Sempre que viajo e me deparo com esta coisa macabra a qual chamam de campanha pela concientização, a vista das latas retorcidas mais parecem dizer de restos mortais das vidas seifadas despropositadamente. Não entendo a lógica de quem produz tais campanhas e acredito que assim como eu a maioria passa rapidamente os olhos e tenta esquecer o mais rápido possível da exposição da "desgraça alheia", que conforme Cristina Haubrich, o fazem sem autorização legal. Quem lhes dá este direito macabro ?
Espetáculos macabros, tais quais faziam nossos antepassados, em pleno século XXI!
É a barbárie mesmo!
Com certeza ninguém pode imaginar a dor sofrida por um ente ao se deparar com os restos do carro acidentado de seus pais exposto em uma campanha de prevenção de acidentes.Por mais que apenas ferros retorcidos, sempre existe uma história muito dolorosa por trás de cada carro acidentado. Essa exposição negligente, sem autorização da família, faz algum sentido pra vocês?? Alguém acredita que essa medida sirva para garantir ou aumentar a segurança rodoviária? A denúncia de que a polícia utiliza esses veículos sem o consentimento da família não nos impressiona. Não em um país como o nosso. Imaginamos que a prevenção de acidentes deveria ser um ato de cidadania cumulado com a proteção integral do Estado. A proteção legal deveria girar em torno da família das vítimas do trânsito e não em torno dos "restos mortais" do automovel daquelas. Acidentes de trânsito já traumatizam famílias sem precisar que a polícia exponha essa dor de forma pública e CRUEL, como nesse caso. Senti muito mesmo por esse desrespeito, "POR ESSA AGRESSÃO", a que uma filha foi submetida pela polícia do Estado do Rio Grande do Sul, uma BARBARIDADE com traumas irreverssíveis para toda família!Que mais pessoas denunciem, processem e mandem cartas para a imprensa, na esperança de que quem nos lê não precise nunca passar por uma situação desagradável como esta!!
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