Por Marlos Mello em 5/10/2010 no Observatório da Imprensa
Ao se contemplar o cenário político-eleitoral brasileiro, nota-se uma série de mudanças e transformações ocorridas de maneira ágil e intensa. O Brasil é um país que vive a democracia e sua população tem nas campanhas eleitorais a oportunidade de ouvir e de dizer o que percebe estar certo e o que precisa mudar. Sob o olhar da democracia, o brasileiro e a brasileira têm a chance de mostrar sua cidadania.
Neste breve texto não entraremos no mérito do significado de cidadania. No entanto, acreditamos que durante as eleições, ser cidadão está vinculado a tudo que corresponde pensar estrategicamente, ou seja, à visão de que os cidadãos podem e devem se apropriar desse conjunto de informações forjadas durante o período eleitoral e fazer, desses saberes, instrumentos na sua atuação diária, nas decisões e escolhas que lhe são de direito.
Vigora, em alguns lugares do Brasil, a ideia de que tudo é respondido nos debates eleitorais na televisão e que somente com essas respostas o eleitor torna-se apto a fazer sua escolha. Entretanto, vamos parar um instante e perguntar: como é definida a pauta de questões relevantes a serem discutidas nos debates? Não sei se você sabe, mas entre os candidatos e os promotores do evento é feito um acordo a fim de decidir os temas. Porém, seria mais justo se a pauta de perguntas fosse posta para a deliberação pública, você não acha? Dito de outra maneira, não seria a população brasileira capacitada para formular as preocupações públicas? O impacto da definição de pauta pelos meios atuais é perceptível não apenas no cidadão comum, que tende a entender como mais importantes as questões destacadas pelos meios de comunicação, mas também no comportamento dos candidatos, que se veem na obrigação de dar uma resposta àquelas questões.
Comunicação hegemônica e alternativa
Um dos pontos que perpassa várias destas contradições é o papel dos meios de comunicação. Ora, os principais debates eleitorais são transmitidos através de concessões públicas de televisão. Porém, dos principais temas debatidos nenhum contempla os meios de comunicação. Em alguns casos, fala-se em liberdade de imprensa, mas não se vai adiante nessa discussão. No Brasil, a mídia representa, em tese, a opinião pública e, por isso, deve ser respeitada em todos os seus argumentos. No entanto, não seria importante debater os meios de comunicação? E, principalmente, as políticas públicas referentes a esse tema?
Mídia e política são dois campos de atuação que convergem num permanente tensionamento. A manutenção dessas forças é ancorada no princípio de que há dois direitos raramente mencionados: o direito à informação e o direito à comunicação (Guareschi, Construtores da Informação, ed. Vozes, 2000). O direito à informação pode ser entendido como aquele que todos nós temos de sermos bem informados e de podermos buscar a informação lá onde for necessário. Mas esse direito não soluciona o problema da comunicação. E mais: muitas vezes mascara o direito humano à comunicação, onde todo ser humano tem direito a expressar sua opinião, manifestar seu pensamento.
Com base na constatação do direito a comunicação, passa a existir a contraposição dos modelos de se comunicar. Isso justifica, por exemplo, a existência de uma comunicação hegemônica e uma comunicação comunitária ou alternativa. De modo geral, a contra-hegemonia surge dos movimentos sociais que, preocupados com a emancipação popular necessária à mudança da sociedade, passam a propor formas de sensibilização. Tal atuação faz-se necessária porque se parte da ideia de que o modelo dominante não garante e não corresponde aos interesses de uma grande parcela da população.
Informações, ideias e estratégias
Independente dos governos e governantes, quem deve discutir sobre os meios de comunicação é a sociedade. Porém, geralmente essa participação é realizada através das sondagens (pesquisas), que constroem uma representação permanente da opinião pública e passam, assim, junto com as informações dos jornais, rádios e televisões, a ser uma condição fundamental para o funcionamento da democracia. Além disso, o público não vota sobre a grande maioria das questões que são abordadas pelas pesquisas e as sondagens são usadas como complemento da legitimidade da imprensa.
Numa sociedade marcada pela diversidade, pelo multiculturalismo, pelos avanços da ciência e da técnica, pelo pluralismo e pelos avanços tecnológicos, a mídia se torna uma arte ainda mais desafiadora. Como construir um diálogo justo que não seja arrogante entre os poderes legitimados e que garanta as mudanças e transformações necessárias, sem permitir um "vale-tudo" nos meios de comunicação? As prioridades atuais levam a questionamentos que se referem à capacidade em lidar com essa nova realidade de convergência entre mídia e política.
Concluindo, o tema da relação entre eleições e mídia aparece hoje, sem dúvida, como um dos mais significativos para a compreensão das novas configurações assumidas pela política brasileira. Contudo, voltando à pergunta que motivou esse artigo, "por que os meios de comunicação não são tema nos debates eleitorais?", devemos ter em mente que os meios de comunicação precisam, urgentemente, parar e repensar a si mesmos. No ano passado, a Confecom (Conferência Nacional de Comunicação) mostrou a lacuna que existe entre a população brasileira e os meios de comunicação.
No entanto, a sociedade está ciente da existência dos meios para se comunicar, mas não tem acesso ao direito à comunicação, que só será conquistado através das reivindicações populares. Dessa forma, acreditamos que o período eleitoral não se definiu na contagem dos votos, embora esse momento seja fundamental para a democracia. É importante esclarecermos que essa eleição só será finalizada na posse dos eleitos e estes irão apresentar e representar a garantia do fluxo de informações, ideias e estratégias para um Brasil melhor e mais justo.
Imagem: Internet
Nenhum comentário:
Postar um comentário