Claudia Cardoso é pedagoga formada pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e é membro da executiva nacional da campanha Quem financia a baixaria é contra a cidadania.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Como foi o encontro preparatório da I Conferência Nacional de Comunicação?
Claudia Cardoso – Do ponto de vista do conteúdo, foi muito bom. Chegamos à conclusão de que a Conferência Nacional de Comunicação precisa acontecer com urgência porque estamos com uma legislação inadequada em relação aos processos que estão aí em função das mudanças tecnológicas. Isso ficou claro quando debatemos a questão da convergência. A participação da sociedade brasileira, no que diz respeito à comunicação social do país, é imprescindível para que possamos mudar o panorama atual. Isso porque os modelos de comunicação vigente estão concentrados em apenas algumas famílias, o que é inconstitucional do ponto de vista da ação social. Esse poder midiático – também ligado ao poder econômico – obriga que a população brasileira se aproprie desse conhecimento e comece a discutir a sua participação em debates acerca dessa questão. Ela precisa participar da mobilização que está organizando esta conferência. Além disso, o governo federal precisa criar conselhos em que a sociedade organizada esteja representada para discutir aquilo que ela entende que seja uma comunicação realmente social. A estrutura do seminário aponta para o fato de que a população precisa participar e que precisamos mudar o marco regulatório da comunicação. As empresas de comunicação já estão sentindo isso, tendo também a necessidade de mudar o marco regulatório. Do ponto de vista do momento histórico, em função do próprio avanço tecnológico, a necessidade de um novo marco regulatório é crescente e extremamente necessária.
IHU On-Line – Por que o governo brasileiro, em sua opinião, ainda não organizou uma Conferência Nacional de Comunicação?
Claudia Cardoso – Talvez porque, a princípio, não seja um assunto tão relevante para eles em comparação com a saúde, com a segurança pública e com as políticas públicas, assuntos que tocam mais a sociedade. Muitos, aliás, pensam que é assim que funciona a comunicação no país. Ou seja, não é um assunto que toque muito. Já o Executivo poderia ter chamado. Nós, aliás, não entendemos por que não se convocou essa conferência ainda. Os movimentos sociais já estão pressionando o governo federal por uma comunicação social mais democrática com a participação da sociedade também desde a Constituinte. Então, essa luta existe há pelo menos 20 anos. No dia 2, tivemos um novo encontro, desta vez em Brasília, para tentarmos mobilizar a população e mostrar força para sensibilizarmos o Executivo.
IHU On-Line – Quais são os problemas do jornalismo contemporâneo?
Claudia Cardoso – Até os anos 1980, tínhamos um jornalismo muito bloqueado pela censura militar. Com a abertura política, poderia haver uma liberdade maior de expressão. No entanto, hoje, os movimentos sociais entendem que a estrutura foi monopolizada por poucas famílias. Então, agora o jornalista tem pouca mobilidade para fazer um jornalismo democrático em função de que quem manda é o dono da emissora, o que é um problema muito sério. Havia resistências no jornalismo impresso durante a ditadura militar. Os jornalistas se rebelavam contra seus patrões. Hoje, não existe mais essa autonomia. Primeiro, em função da precariedade da função do jornalista. Segundo, porque o jornalista só pode atender aos interesses do dono do jornal. Não há mídia sem falar em poder econômico. Esse é o grande problema.
IHU On-Line – Para a senhora, até onde vai a independência do jornalista?
Claudia Cardoso – Do ponto de vista dos movimentos sociais, a independência vai até o momento em que não se desacata o patrão. Esse é um grande problema para o jornalismo.
IHU On-Line – Qual é o papel da mídia livre? Ela deve lutar para combater os monopólios midiáticos ou sua preocupação deve restringir-se a veicular o que a grande imprensa não informa?
Claudia Cardoso – Na minha opinião, a mídia livre precisa trazer novas pautas. A mídia livre está voltada a um público específico e, portanto, menor. Ela possui uma dupla função: fazer denúncias em relação à prática da grande imprensa e contrapor questões, além de trazer novas pautas.
IHU On-Line – Frente ao cenário de convergência tecnológica, o que precisa ser modificado na legislação brasileira em relação aos meios de comunicação?
Claudia Cardoso – Há uma coisa nova aí que ainda não sabemos como vai funcionar. Precisamos voltar a pensar na questão da responsabilidade social por parte das empresas de comunicação, a forma como as concessões serão feitas e como os concessionários terão de atuar dentro dessa nova plataforma. Não é o objeto em si o problema, mas sim os princípios legais em relação a como se garante a concessão pública dentro dessa plataforma. Esses aspectos precisam ser debatidos na conferência porque é necessário atentar para questões que estão acontecendo contra a legislação da comunicação. Precisamos discutir junto com a sociedade como fazer esse novo marco regulatório que dê conta dos problemas atuais.
IHU On-Line – Que modelo de entidade reguladora precisamos?
Claudia Cardoso – Além da legislação ser inadequada, entendemos que precisa haver um operador público que possa dividir e ajudar no controle dessas novas televisões e dessa nova plataforma. Esse operador tem como dividir o espaço de forma correta. Essa figura não existe hoje, mas é importante para que possamos democratizar o espaço na rede. É possível, portanto, criar essa figura.
IHU On-Line – Quais são as principais questões que devem ser tratadas na I Conferência Nacional de Comunicação?
Claudia Cardoso – Um novo marco regulatório, o formato das comunicações digitais no Brasil, convergência, concentração dos meios e a participação do povo brasileiro. Precisamos garantir mecanismos de participação da população e dos movimentos sociais nas decisões comunicações no país. Além disso, necessitamos ainda de um processo educacional, além de educar o povo para as mídias. Não se pode pensar num marco regulatório sem pensar, ao mesmo tempo, em processos educativos.
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