Assim que começamos a ler os artigos de Adão Paiani, publicados no RSurgente, ficamos curiosos em saber o que o levou a buscar a blogosfera e qual a opinião que ele teria sobre a mídia corporativa.
Decidimos, então, enviar-lhe três perguntas, cujas respostas vocês conferem abaixo:
Dialógico: 1. Qual a sua visão da mídia antes dos fatos que o levaram a escrever para a blogosfera?
Adão Paiani: Não era diferente da que tenho agora. Sempre tive muito clara a existência de uma relação absolutamente promíscua entre a grande mídia, e não apenas entre essa, como corporações, mas também individualmente entre determinados jornalistas e comunicadores, e os mandachuvas do momento, sejam eles quais forem. O poder e suas benesses têm um fantástico poder de atração. Não vamos nos esquecer que mídia é business; e se a essa visão somar-se uma falta de compromisso com a verdade e o interesse da sociedade; já sabemos no que dá.
Olhando para trás e analisando fatos da história recente do nosso país, como a campanha pela anistia, pelas diretas, o impeachment do Collor; é fácil constatar que eles só ganharam manchetes nas primeiras páginas quando não havia mais como segurar, desconstituir ou ignorar o apelo das ruas. Mas até o último segundo, as mídias e profissionais comprometidos com o establishment, defenderam os interesses de quem lhes acenava com polpudas verbas de publicidade, e outras coisas mais, em troca de uma pauta domesticada, covarde e conivente. O que menos interessa para essa gente é o interesse público. Aí querer falar em imprensa livre num contexto desses é conversa mole pra boi dormir.
D: 2. Em que momento o senhor percebeu que seria necessário escrever para a blogosfera?
AP: Há bastante tempo que eu já acompanhava determinados blogs. Gosto da discussão livre de idéias e a interação entre quem escreve e quem lê e opina. É um espaço plural, de exercício dialético e que cada vez mais pelas suas características se transforma em um instrumento poderoso de disseminação de idéias.
A mídia convencional mantém com seus colaboradores uma relação igualmente convencional. O espaço para exercício de uma visão crítica é muito limitado e condicionado aos interesses dos quais falei anteriormente. Como permitir a crítica ao anunciante? Como apontar as falhas dos poderosos, quando essa relação de poder pauta, dentro de um veículo convencional, o que deve ou não deve ser publicado; deve ou não deve ser mostrado?
No meu caso pessoal, a busca pela blogosfera foi uma conseqüência natural do processo que vivenciei quando de minha saída do governo. Saí de um governo que, não contente em afastar fisicamente quem se contrapõe a suas práticas criminosas, também busca desacreditar e silenciar os desafetos. E sabe que tem poder para isso na mídia corporativa. Só que, sem falsa modéstia, comigo eles tomaram o bonde errado; pelo simples fato de que tenho o que dizer, e sei como dizer.
Pensando que me silenciariam com a mera exoneração de um cargo e com a certeza de que não teria espaço nos espaços que eles dominam; acabaram abrindo caminho para que eu pudesse expressar minhas idéias a um público qualificado, formador de opinião e que pode ser atingido rapidamente, sem intermediários, com a possibilidade de um debate enriquecedor.
D: 3. Como avalia a relação da mídia corporativa com os acontecimentos envolvendo a política no RS?
AP: Promíscua, indecente, imoral, abjeta, vergonhosa; e por aí eu poderia ficar desfiando um corolário de outros qualificativos de igual calibre. Mas também não é pra menos. O que o Governo YRC tem despejado de dinheiro na mídia guasca é algo que duvido tenha precedentes desse porte.
Temos hoje dois tipos de posicionamento da imprensa gaúcha com relação às denúncias contra Yeda e sua quadrilha. Uma parte finge exercer um jornalismo imparcial; na base do “morde, assopra”, muito mais assoprando do que mordendo. A outra descaradamente defende o pior governo da história do Rio Grande, sem se ater a tudo que já foi provado e faz uma leitura Orwelliana da realidade; onde mentira é verdade, promiscuidade é pureza, falta de caráter é valor.
Mas é claro que não podemos creditar à permanência de Yeda e sua quadrilha apenas aos seus lacaios da imprensa. Como disse no início, por mais que exista essa relação espúria entre governo e mídia corporativa, a voz e a pressão das ruas sempre poderão falar mais forte.
O que temos é uma conjunção de fatores; um ambiente que favorece a um governo de ratos se manter a tona. Além da mídia, uma base parlamentar comprada por um valor em muito superior ao que realmente vale; e uma opinião pública que não se manifesta com a veemência que deveria. Sem tomada de consciência da sociedade, e uma verdadeira mobilização popular, continuaremos a ser espoliados até o fim. E ainda mais além.
*Adão Paiani, advogado e ex-Ouvidor da Secretaria da Segurança Pública do Governo YRC, exonerado após ter denunciado vazamento de escutas do Sistema Guardião.
Foto: Guerreiro/AG AL.
11 comentários:
Nota 100!
Porrada no plexo solar.
Ele não vale nada e ficou mamando no governo Yeda o quanto pode até ser enxotado. Eu sou testemunha do silêncio desse homem sobre o brutal espancamento de mulheres,crianças, velhos e homens quer a BM&Mendes fizeram no parque da harmonia em 2008. Não dou corda pra esse verme.
Kiko, apontamos, aqui, as contradições desse sistema defendido pelo articulista.
Abraço!
Kiko:
Acho que todos têm direito a uma resposta.
Tenho nome completo, endereço, profissão e posições muito bem definidas. E estou sempre disposto a defendê-las democraticamente.
Espero o mesmo de ti, pois atacar e fugir ao debate é uma posição fascista, incompatível com quem verdadeiramente defende o que tu dizes defender.
Aliás, essa postura de dono da verdade lembra muito YRC, que nos trouxe até esse estado de coisas. Desqualificar, que é uma das práticas prediletas dela, qualquer um pode fazer, não precisa mais de dois neurônios prá isso. Já debater exige um pouco mais.
Então, vamos ao debate.
Adão Paiani
ajcpaiani@gmail.com
O sr. apresenta o argumento de Kiko Machado de modo falacioso - uma vez que sua desqualificação é uma consequência do argumento por ele apresentando, a saber, o de que o sr. silenciou, enquanto ouvidor agrário, sobre a violência institucional do governo Yeda Crusius - e comete uma contradição performática, pois mostra que desqualificar o adversário não é um bom argumento desqualificando seu interlocutor.
Até onde eu saiba, o sr. de fato silenciou sobre a violência institucional cometida contra sem-terras enquanto ouvidor agrário do novo jeito de governar. Não só silenciou como, quando se trata de a legitimar, é um dos primeiros a ser procurado pelo Grupo RBS - papel no qual o sr. parece se sentir extremamente à vontade -, como no recente caso das anotações apócrifas supostamente encontradas em uma lata de lixo e atribuídas ao MST, nas quais supostamente o movimento comemorava o assassinato de Elton Brum da Silva como um trunfo político para sua causa.
Aliás, como o sr. deve estar bem lembrado, na entrevista concedida à Zero Hora nessa oportunidade - e aparentemente sem se preocupar com a veracidade das referidas anotações ou com as consequências ideológicas delas extraídas pelo Grupo RBS -, o sr. afirmou que não lhe surpreendia o "uso político" da morte de Elton Brum da Silva pelo MST, estratégia que classificou como "barbaridade".
Bem, como o sr. também deve estar lembrado, em outra oportunidade afirmou temer que governo e comando da BM estivessem ganhando tempo para encobrir provas e proteger o oficial supostamente responsável pelo assassinato de Elton Brum da Silva, encontrando algum soldado que assumisse o crime em seu lugar. A esse propósito, chegou a afirmar que, "se essa conta for debitada a um soldado da Brigada, eu, como filho de um soldado da Brigada, vou apontar o nome do autor do homicídio".
Pois bem. Governo e BM parecem ter encontrado o referido soldado, mas o sr. parece ainda não ter encontrado forças, ou quiçá oportunidade em ZH, para apontar o nome do autor do homicídio. Logo, uma das conclusões que podem ser extraídas das premissas acima é a de que, enquanto o sr. não cumprir essa sua promessa - mas não exclusivamente por isso -, nada impede que tomemos seus arroubos humanitários como "uso político" da morte de Elton Brum da Silva, estratégia que, analogamente, também pode ser classificada como uma "barbaridade".
Mas, veja só o sr. como é a vida, por que será que não me surpreende tal estratégia, vinda de um dedicado ex-integrante do pior governo da história do RS?
Numa coisa, pelo menos, o sr. está correto. Debater, principalmente tendo princípios e compromissos como norte, exige um pouco mais. O resto é puro oportunismo.
Estabelecer diálogo entre antagônicos é difícil, diria até impossível de acordo com Paulo Freire.
Os comentários aí estão para comprovar. Apesar das diferenças políticas partidárias entre nós e o Sr. Paiani, e muita coisa a ser esclarecida, no tocante à mídia, pontos de diálogo são possíveis, como evidenciou-se nas respostas enviadas.
Bueno, o contraponto vai ser longo; mas essa é a vantagem da blogosfera.
Primeiro Lugar. Nunca neguei, ao contrário; faço questão de enfatizar minhas profundas divergências de ordem ideológica, conceitual e estratégica com o MST.
Ideológicas, porque nesse aspecto divergimos quanto ao modelo de sociedade que queremos construir, e por achar que a luta pela terra é algo sério demais para ser utilizado como mero instrumento de luta ideológica.
Conceituais, porque não acredito no modelo de reforma agrária defendida pelo movimento, e que vemos na maioria dos assentamentos.
A mera distribuição de lotes sem uma estrutura de apoio que fixe as famílias na terra dando efetivas condições de geração de trabalho, renda e autonomia, pelo menos em médio prazo, para as famílias assentadas é uma falácia. Gera as distorções que vemos, com assentados sendo levados a arrendarem ou venderem ilegalmente seus lotes e recriando, com outros donos ou até mesmo com os antigos, o latifúndio. É uma reforma agrária às avessas. E quem disse isso não é só eu, mas o Superintendente do Incra no RS; recentemente.
Sou contrário à distribuição de títulos individuais, que não servem para outra coisa que não seja inflar o número de famílias assentadas; como se isso fosse indicativo de sucesso na reforma agrária.
Defendo o coletivismo e a exploração associativa dos assentamentos, respeitando o perfil de produção das regiões em que sejam criados e das próprias famílias assentadas.
Estratégicas, porque o que a gente vê, por erros primários, no meu entendimento, é um movimento socialmente legítimo e justo cada vez mais se isolar da sociedade, com métodos injustificáveis que somente fortalecem o discurso contrário de seus adversários e na prática comprometem e atrasam um processo que já iniciou no Brasil com pelo menos um século e meio de atraso. (continua...)
Em segundo lugar. Não aceito a acusação de conivência com abusos ocorridos durante confrontos entre a Brigada Militar e os movimentos, em especial aqueles envolvendo o MST; pela convicção de que ela é injusta.
Considero desnecessário defender a minha atuação naqueles dias, pois não há o que ser defendido. Busquei fazer a coisa certa e agi de forma a não ter nunca de sair em minha própria defesa, me comprometendo com a verdade; e só com ela; mesmo num ambiente de absoluto em relativismo moral; mas acho necessário fazer algumas colocações.
Estive à frente de um órgão criado para funcionar apenas no papel, sem nenhuma estrutura operacional que permitisse uma atuação mais eficiente, pelo próprio desinteresse do Governo estadual. Sem nenhum apoio político interno, uma vez que dentro de um contexto de governo absolutamente desfavorável; ou externo, uma vez que visto com desconfiança pelos segmentos de luta social, exatamente por fazer parte desse governo.
Com todas as limitações, pelo menos evitamos que mais episódios como o do Elton tivesse ocorrido antes. Não tenho sangue nas mãos.
Aliás, antes, alguém sabia da existência antes de uma Ouvidoria no Estado? Pois é, ela foi criada no governo Olívio, em 1998. Em que outros conflitos ela atuou antes? Prá quem não sabe, em nenhum. O Ouvidor sempre foi uma figura de gabinete.
Por não ser do meu perfil o trabalho meramente burocrático; muitas foram as noites geladas e mal dormidas, cruzando estradas e picadas nos grotões do Rio Grande,acompanhando operações prá mediar, negociar; tentar conciliar o inconciliável.
E quando tudo dava errado, amparar os feridos, conseguir água, comida, um canto para colocar centenas de homens, mulheres e crianças. E quando acabava só restava o consolo de que não havia morrido ninguém. (continua...)
Com relação ao verdadeiro autor do assassinato do Elton; que posso fazer se o soldado, sob que tipo de promessa não se sabe, mas bem se pode imaginar; decidiu assumir um crime que não prometeu? No momento que fez isso, virou réu confesso.
Se decidir falar a verdade, eu serei o primeiro a estar lá, ao lado dele; repondo a verdade no seu devido lugar. E ele sabe disso porque foi dito a ele. Mas não vou defender um mentiroso.
A propósito, fui o primeiro a levantar e sustentar essa versão, e não fui desmentido pela Brigada, até porque eles sabem que não poderiam me desmentir. Sabem o que fizeram. Mas assim como eu, deputados da base de apoio do próprio movimento também tiveram a informação; a mesma que tive, por mim e por outras fontes. E silenciaram.
E olha que eles tem algo que eu não tenho, imunidade nas manifestações no exercício do mandato. E eu sou omisso?
Uma Comissão Especial, criada no Ministério da Justiça, para investigar a criminalização dos movimentos sociais no RS; que esteve aqui duas vezes, uma inclusive depois do assassinato, após um ano e dois meses e um relatório de vinte e três páginas, onde a morte do Elton recebeu menção de pouco mais de duas linhas; não fez nenhum questionamento sobre as circunstâncias de sua morte, quem puxou o gatilho, como foi a condução do inquérito e o seu resultado.
Chancelaram a história oficial, quando deveriam pelo menos ter se dado ao trabalho de questioná-la.
E eu é que sou conivente, covarde e omisso? Então tá.
Por fim, ter uma visão humanitária não é privilégio de ninguém e de nenhum campo. É questão de caráter e formação.
A diferença é se reconhecer que as virtudes e as misérias humanas estão em toda a parte, por todos os lados. Defender essa ou aquela bandeira política, apesar de um bom indicativo, não é necessariamente a garantia de estarmos frente um ser humano melhor ou pior.
E o oportunismo muitas vezes está travestido de boas intenções, que sem ações concretas; mesmo se sujeitando ao erro; não trazem nenhum resultado prático na vida ou na morte das pessoas. Elton Brum da Silva que o diga.
Só pela oportunidade de poder colocar isso tudo já valeu o espaço e iniciar um debate! E acreditem, nossas diferenças são menores do que parecem.
Abraço!
Paiani
ajcpaiani@gmail.com
O sr. não entendeu meu ponto. Não estou minimamente interessado em "iniciar um debate" sobre sua trajetória política no novo jeito de governar, pois ela é, por si só, suficientemente eloquente, pelo menos segundo meu juízo, e não ocupa tanto assim meus pensamentos, como pude ter dado a entender. Guarde suas prolixas e cínicas lamúrias para seus convescotes com Yeda Crusius et caterva no Palácio das Hortênsias.
Ademais, as esdrúxulas justificativas acima desesperadamente arroladas - que, aliás, não responderam satisfatoriamente a nenhum de meus argumentos -, absolutamente não me dizem respeito. Não é comigo que o sr. tem contas a acertar.
Pensei que nada além de sua hipocrisia - se alguma dúvida sobre ela ainda pairava, dissipou-se com sua esquizofrênica crítica, ponto central de sua entrevista ao Dialógico, à postura da mídia hegemônica gaúcha em relação ao governo Yeda Crusius, os mesmos "lacaios da imprensa" dos quais costuma lamber as botas quando diante do brilho fugaz de seus holofotes - seria capaz de revoltar meu estômago, mas subestimei seu pedantismo. Creia, meu senhor, que nossas diferenças são bem maiores do que jamais imaginou.
E poupe seus abraços para seus iguais, pois não abraço quem não conheço.
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